O Google é, de longe, a empresa que domina a internet na prática. A busca está em toda parte e, por mais que recentemente os marqueteiros tenham insistido em mostrar facetas do Google com ar mais vanguardista – das viagens espaciais aos balões de acesso à internet; do Google Glass aos carros sem motorista –, ninguém tem dúvida de que o negócio do Google ainda é a busca. Foi daí que retirou 90% de seu faturamento, de US$ 66 bilhões no ano passado.

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Qualquer ameaça à busca é, portanto, uma ameaça ao Google. Sua decisão de lançar há alguns anos o sistema para celulares Android está ligada a isso. O Google não poderia aceitar que a informação hoje disponível de forma livre na web migrasse para dentro dos celulares sem que pudesse ter acesso a ela. Daí tentar dominar o próprio universo dos dispositivos móveis. Alguns dias atrás, em sua conferência I/O, promovida para desenvolvedores, o Google deu um passo ainda maior na tentativa de ampliar o alcance de seu gigantesco índice de busca – chamado pomposamente de “grafo do conhecimento”. Anunciou que o projeto que indexa todo o conteúdo dos aplicativos que rodam no Android será estendido ao sistema dos celulares da Apple, o iOS.

É importante entender o significado disso em retrospecto. Legalmente, o Google sempre se sentiu à vontade para copiar o conteúdo de qualquer site da internet, reproduzir artigos acadêmicos, livros e imagens – tudo para turbinar o conteúdo de seu índice de buscas. Quando as informações começaram a migrar para dentro dos aplicativos em dispositivos móveis, deixaram de ser abertas. O Google decidiu então criar seu próprio sistema móvel, o Android, de modo que pudesse indexar o conteúdo de qualquer aplicativo desenvolvido para ele. Até hoje, já reuniu mais de 50 bilhões de links para conteúdos internos aos aplicativos. Pois, agora, decidiu que também quer indexar os aplicativos de outras plataformas concorrentes, a começar pelo sistema da rival Apple. “Não dá para exagerar a importância dessa iniciativa”, afirmou em artigo a respeito no site Backchannel o respeitadíssimo jornalista de tecnologia Steven Levy.

O objetivo final do Google não é evidentemente ficar nos tablets e celulares, nem mesmo nos recentes relógios inteligentes, ou smartwatches. Os aplicativos estão aos poucos migrando para um universo que os marqueteiros batizaram de “internet das coisas”. Chips estarão em toda parte: geladeiras, carros, móveis e até nas roupas. Aplicativos serão a forma como nos comunicaremos com toda a infra-estrutura digital. Para o Google, acessar a informação que circula dentro desses aplicativos é uma questão de sobrevivência no novo universo.

Não será fácil convencer os desenvolvedores de aplicativos a fornecer acesso a seu conteúdo. Mas eles têm interesse em aparecer e ampliar os downloads de seus programas. Estar na ubíqua busca do Google pode se tornar vital para isso. À medida que esse índice se tornar mais e mais gigantesco, ele poderá decidir pelo sucesso ou fracasso de um aplicativo, apenas pela ordem em que aparece na busca. Nada muito diferente do que acontece hoje com páginas da web que se estapeiam para subir nos rankings do buscador, por meio das técnicas genericamente conhecidas pela sigla SEO. Em seu blog, o Google já anunciou alguns desenvolvedores de aplicativos que toparam ser indexados, como Pinterest e Huffington Post. Se a iniciativa conseguir atrair a maioria dos apps para o buscador, é previsível, no futuro, um conflito ainda mais duro do que aquele que hoje opõe o Google aos produtores de conteúdo.